domingo, 9 de fevereiro de 2014

Interpretação de texto 9º ano

A carta de um condenado
Bartolomeo Vanzetti

21 de agosto de 1927.
Da Casa da Morte na prisão de Massachusetts.

Meu caro Dante:
            Ainda espero, e combateremos até o último momento, reivindicar o nosso direito de vida e de liberdade, mas todas as forças do Estado e do dinheiro e reação são implacavelmente contra nós, porque somos libertários ou anarquistas.
            Escrevo pouco a respeito disto porque és ainda muito criança para compreender estas e outras coisas sobre as quais eu gostaria de conversar contigo.
            Mas hás de crescer e compreender o caso meu e de teu pai, os princípios meus e de teu pai, princípios pelos quais nos vão matar dentro em pouco.
            Digo-te agora que, por tudo que sei de teu pai, ele não é criminoso, mas um dos homens mais direitos que já conheci. Um dia compreenderás o que te estou dizendo. Que teu pai sacrificou tudo o que há de mais caro ao coração e à alma humana pela justiça e liberdade de todos. Nesse dia terás orgulho de teu pai, e se fores bastante corajoso, tomarás o seu lugar na luta entre a tirania e a liberdade e vingarás o seu (os nossos) nomes e o nosso sangue.
            Se de fato morrermos agora, saberás um dia, quando te tornares capaz de compreender esta tragédia em toda a sua extensão, como teu pai foi bom e corajoso contigo, teu pai e eu, durante estes oito anos de luta, tristeza, angústia e aflição.
            Desde este instante mesmo serás bom e corajoso com tua mãe, com Inês e com Susie – corajosa e boa Susie – e farás tudo para as consolar e ajudar.
            Gostaria também que te lembrasses de mim como camarada e amigo de teu pai, de tua mãe, de Inês, de Susie e de ti, e te afianço que também não sou um criminoso, que não cometi nenhum roubo nem morte, mas apenas combati modestamente para abolir os crimes entre os homens e para defender a liberdade de todos.
            Sabe, Dante, que quem disser o contrário de teu pai e de mim, é um mentiroso a insultar dois mortos inocentes que viveram como homens de bem. Sabe também, Dante, que, se teu pai e eu tivéssemos sido cobardes e hipócritas e renegadores de nossa fé, nos teríamos salvado. Não se condenaria nem mesmo um cão leproso, não se executaria nem mesmo o escorpião mais venenoso com fundamento nas provas que forjaram contra nós. Conceder-se-ia novo julgamento a um matricida e criminoso relapso, se apresentasse recurso como o que apresentamos para obter novo julgamento.
            Lembra-te, Dante, lembra-te disso; não somos criminosos; forjaram uma traça para condenar-nos; negaram-nos um novo julgamento; e se formos executados depois de sete anos, quatro meses e dezessete dias de indizíveis torturas e injustiças, será pelo que já te disse; porque éramos pelos pobres e contra a exploração e opressão do homem pelo homem.
            Dia virá em que compreenderás a causa atroz das palavras acima escritas, em toda a sua extensão. Então nos honrarás.
            Sê sempre bom e corajoso, Dante. Abraço-te.

Bartolomeo

P.S.: Deixo o exemplar da Bíblia Americana para tua mãe, pois ela há de gostar de lê-la e passará às tuas mãos quando chegares à idade de a entender. Guarda-a como lembrança. O livro testemunhará também como Mrs. Gertrude Winslow foi boa e generosa para com todos nós. Adeus, Dante.

(em M. Lincoln SCHUSTER, As grandes cartas da História; desde a Antiguidade até os nossos dias. Tradução de Manuel Bandeira. São Paulo, Nacional, 1942. Páginas 519-521. Biblioteca do Espírito Moderno. Série 3ª, volume 22.)




O autor
Bartolomeu Vanzetti era um imigrante italiano, peixeiro, vivendo nos Estados Unidos na década de 20. Ele e seu amigo Nicola Sacco, também imigrante, sapateiro, eram homens idealistas, de pouca instrução. Foram líderes sindicais e anarquistas, opondo-se ao governo dos Estados Unidos, que consideravam os anarquistas tão perigosos quanto os comunistas.
             Em maio de 1920, Sacco e Vanzetti foram presos perto de Boston, Massachusetts. Vanzetti, sob a acusação de ter participado de uma tentativa de assalto a um armazém; ambos, acusados do assassinato de um pagador e de um guarda de uma fábrica, mortos durante um assalto. O julgamento foi praticamente uma farsa: embora a defesa tenha apresentado cerca de 107 testemunhas de que os acusados não se encontravam no local dos crimes, eles foram condenados, depois de um processo que durou 7 anos.
            Houve grande interesse nacional e internacional pelo caso de Sacco e Vanzetti. Inúmeras listas, assinadas por intelectuais e pessoas importantes, protestavam a inocência dos dois italianos, intercedendo a seu favor. De nada adiantaram: existia um consenso segundo o qual, havendo oportunidade, todos os que se opunham efetivamente ao sistema político vigente deviam ser condenados.
            A pena de morte foi decretada em abril e, a 23 de agosto de 1927, Sacco e Vanzetti foram executados na cadeira elétrica.

(Adaptado de História do século 20. São Paulo, Abril Cultural, 1974. Páginas 1239-1240.)

INTERPRETAÇÃO DE TEXTO:
1.    Logo no início da carta, Vanzetti  manifesta uma  esperança. Qual é?
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2.    O que se opõe a essa esperança? Por que?
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3.    Vanzetti  tem um motivo para escrever a Dante, que é ainda uma criança. Que motivo é?
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4.    Qual é a opinião de Vanzetti sobre Sacco?
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5.    O que ele espera de Dante, em relação ao pai?
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6.    O que Vanzetti espera de Dante em relação a si mesmo?
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7.    O que ele conta a Dante sobre o julgamento e condenação dele e de Sacco?
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8.    Segundo Vanzetti, por que ele e Sacco serão condenados?
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